CARTA DE MANAUS

Os professores e professoras dos cursos de Jornalismo associados à Associação Brasileira de Ensino de Jornalismo reunidos no 22o ENEJor – Encontro Nacional de Ensino de Jornalismo, realizado na Universidade Federal do Amazonas, em Manaus, entre os dias 25 e 28 de abril de 2023, de forma híbrida (presencial e remota), consideraram os resultados dos debates promovidos no evento e aprovaram o presente documento:

Ao longo dos últimos quatro anos, assistimos com assombro e pesar ao desmatamento dos biomas das florestas do Brasil, à destruição de conquistas construídas e ao extermínio de vidas. A condição contemporânea impõe urgências a diversos campos da vida humana. Assim também se passa com o ensino do jornalismo, provocado a se debruçar em questões que vão do meio ambiente à situação dos povos indígenas, das desigualdades de gênero à necessidade de regular as inovações tecnológicas e seus aspectos desumanizantes, da insegurança alimentar à luta pela dignidade no trabalho. 

No entanto, num cenário de profundos desafios em diversas escalas, do global ao hiperlocal, o jornalismo em crise se vê desconectado das camadas populares e dos mais jovens, como lembrou o professor Eduardo Meditsch (UFSC). Eugênio Bucci (ECA-USP) alertou sobre a emergência de uma “crise de pensamento” na profissão: estariam as redações e os jornalistas perdendo a capacidade de refletir sobre a própria produção?

O 22° Encontro Nacional de Ensino de Jornalismo (Enejor) abraçou esse feixe de desafios e temáticas urgentes. Ao longo de quatro dias, palestras, seminários, oficinas, grupos de trabalho e de pesquisa reforçaram que a circulação social dos saberes da ciência e de defesa do meio ambiente exigem do jornalista e da jornalista um conjunto de saberes e competências que só podem ser adquiridas por meio de robusta formação específica

Que nossas discussões tenham se dado em Manaus, no coração do ecossistema do mais diverso e importante bioma planetário, conferiu concretude ao debate conceitual. A mudança climática é hoje um tema político, científico, econômico e social – mas o aprofundamento da temática no campo jornalístico ainda é insuficiente, como definiu Rogelio Fernández-Reyes (Universidad Complutense de Madrid) na palestra de abertura do 22° Enejor. A demanda por um jornalismo comprometido com a sobrevivência planetária exige uma palavra-luta em que se encontram o ensino de jornalismo e as demandas das entidades de classe e associações de pesquisa: profissionalização. 

Samira de Castro, presidenta da Fenaj, apresentou no 18° Pré-Fórum da Federação Nacional de Jornalistas (FENAJ) um rol de pautas da categoria que encontram agora, espera-se, terreno mais propício para o debate na esfera pública. Da PEC do Diploma à regulação das plataformas, da criação de um Conselho Nacional de Jornalistas (CNJ) à atualização da regulamentação profissional, da instauração de piso salarial à revogação das contrarreformas, muito diz respeito ao ensino do jornalismo.

Por seu papel central nessa luta, a Abej deve liderar esse movimento junto às escolas de jornalismo do Brasil. Entre as ações iniciais, destaca-se o documento em defesa da aprovação da PEC, encabeçado pela Abej e que foi assinado pelas entidades da área. Com o apoio dos coordenadores, vamos enviar por fontes diferentes aos deputados e deputadas, buscando ainda o envolvimento dos alunos por meio dos CAs e a divulgação em veículos de comunicação para alcançar o conjunto da sociedade. Considera-se a necessidade de uma formação prévia consistente, que dê conta da complexidade do jornalismo como forma autônoma do conhecimento. Formação essa que também reconhece o importante avanço obtido com as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), aprovadas em 2013. 

O 13º Encontro Nacional de Coordenadores de Curso de Jornalismo trouxe outros aportes. Das cinco regiões do país, coordenadores e coordenadoras relataram os desafios da implantação da curricularização da extensão, do aligeiramento da formação por conta de demissões em massa, do fechamento de cursos e a ainda mal resolvida regulamentação dos estágios. Apontou-se a necessidade de que o Ministério da Educação (MEC) e suas autarquias sejam provocados a exercer suas funções de indução de políticas e de fiscalização da sua implementação. A Abej entende seu papel nessa necessária interlocução.

A realização de evento inédito no estado do Amazonas contou com 265 participantes locais. Grupos de Trabalho e de Pesquisa totalizaram 57 artigos científicos, com mais de 100 autores. Os destaques comporão um dossiê da Revista Brasileira de Ensino de Jornalismo (Rebej). 

Salientou-se, ainda, a importância do jornalismo científico, apontando a necessidade de ser contemplado nos cursos de Jornalismo do país, tendo em vista sua real contribuição para a sociedade.

O Encontro Nacional de Ensino de Jornalismo representou a culminância de um processo que passou pela retomada dos Encontros Regionais de Ensino de Jornalismo (Erejor). A construção laboriosa realizada pelas direções regionais não apenas manteve o trabalho da Abej em evidência ao longo do ano, como também teve impacto direto na elevada representatividade estadual no Encontro Nacional, que contou com congressistas de 17 estados. Também são dignos de menção o comprometimento e a competência da organização local, capaz de operar complexa logística que integrou a Universidade sede a mais cinco outras instituições de ensino de jornalismo no estado do Amazonas.

Assim, os professores e professoras reunidos no 22o Enejor aprovam as seguintes ações:

  1. Defesa da PEC do Diploma, que restitui a obrigatoriedade de formação superior em jornalismo para o exercício profissional;
  2. Fomentar o rigor na fiscalização e avaliação de cursos, de modo a contemplar aspectos como a adoção das DCNs e uma efetiva curricularização da extensão;
  3. Protagonizar o debate sobre a revisão da classificação dos cursos de jornalismo no CINE Brasil, com vistas a sublinhar a autonomia do campo e sua conexão com o campo da Comunicação;
  4. Buscar retomar assento nas comissões e comitês referentes à avaliação de cursos.
  5. Promover discussões sobre a adoção de novas tecnologias no jornalismo, evidenciando seu alcance e potencial, sem perder de vista os riscos técnicos e éticos à profissão; 
  6. Fortalecer a rede de professores de jornalismo por meio dos encontros regionais e nacional, com foco nos coordenadores de curso como mobilizadores da associação à Abej;
  7. Aprofundar o papel protagonista da Abej na discussão das metodologias do ensino do jornalismo;
  8. Divulgar a Rebej de forma a aumentar o número de submissões, sem abrir mão da qualidade editorial da revista;
  9. Incentivar a formação em jornalismo científico e ambiental nas graduações em jornalismo, tendo em vista o contexto de emergência climática e seus impactos sobre populações vulneráveis e povos originários;

Manaus, 28 de abril de 2023.

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